Amor é Amor

Indígenas LGBTQIA+ vivem uma dupla exclusão e, muitas vezes, são invisibilizados pela sociedade. Mas estão ocupando as universidades, os museus, a indústria da música e diversos outros espaços em busca de respeito e reconhecimento.


Semana do Orgulho LGBTQIA+ na BRDO

Na última segunda, dia 28 de junho, foi comemorado o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+. A Braziliando continua com sua programação dedicada à temática, buscando contribuir com a valorização da diversidade e promover diálogos inclusivos. Você pode conferir outras ações clicando aqui e conhecer o significado da sigla aqui.

A comunidade LGBTQIA+ luta coletivamente em busca dos mesmos direitos: o direito de amar e de ser quem se é. Mas existem outras demandas dentro da comunidade, igualmente urgentes e necessárias: mulheres que também lutam por igualdade de gênero, pessoas com deficiência que lutam por inclusão e pessoas negras e indígenas que também lutam pelo fim do racismo.

Essas questões são somadas à LGBTfobia e aumentam o sentimento de insegurança e a exclusão dessas pessoas na sociedade. Por isso, precisamos enxergar a imensa diversidade de realidades e pessoas que compõem a comunidade para uma luta realmente coletiva e plural, onde as individualidades de cada pessoa sejam respeitadas e celebradas.


Vamos falar sobre indígenas LGBTQIA+?

Para conhecermos um pouco destas outras lutas dentro do movimento, hoje falaremos sobre indígenas LGBTQIA+. Você conhece indígenas da comunidade? Você sabia que o primeiro caso registrado de homofobia brasileiro foi contra um indígena? Já pensou em como a pandemia afetou suas vidas?

Tibira

Sob o pretexto de “purificar a Terra do abominável pecado da sodomia”, o indígena Tibira foi o primeiro caso registrado de morte por homofobia no Brasil. Em 1614, o religioso francês Yves d’Évreux ordenou a prisão, tortura e execução de Tibira do Maranhão, que pertencia a etnia Tupinambá. Os indígenas usam o termo “tibira” para se referirem a homens homossexuais. 

Aos pés do antigo Forte de São Luís (MA), Tibira foi amarrado pela cintura à boca de um canhão e teve seu corpo destroçado. A crueldade de seu assassinato tinha o objetivo de servir de exemplo para quem estivesse presente, já que líderes de outras etnias indígenas foram convocados para assistirem sua execução, e de eternizar a punição, no livro “Histórias das Coisas Mais Memoráveis Acontecidas no Maranhão nos Anos de 1613-1614”.

Quem resgatou esta história e, hoje, luta para que ela ganhe mais visibilidade, foi o sociólogo, antropólogo e ativista do movimento LGBTQIA+, Luiz Mott. Em 2014, Mott publicou “São Tibira do Maranhão — Índio Gay Mártir” onde relata e contextualiza o caso, denunciando a imposição cultural dos colonizadores aos povos originários. Outro pesquisador que também aborda as consequências dessa imposição, é o antropólogo Estevão Fernandes em seu livro “Existe Índio Gay?: A Colonização das Sexualidades Indígenas no Brasil”.

A luta de jovens indígenas LGBTQIA+

A diversidade indígena é muito maior do que imaginamos: são mais de 800 mil pessoas em todo país, de 305 diferentes etnias e falando 274 línguas. Somada a esta riqueza cultural, existe uma infinidade de corpos, vivências e identidades dentro deste grupo.

A juventude indígena vem buscado incluir na discussão as pautas de gênero e sexualidade, mesclando com as demandas históricas de demarcação de terras e educação. O objetivo é ampliar a rede de proteção e apoio, trazendo indígenas LGBTQIA+ para dentro do movimento e pessoas não-indígenas integrantes da comunidade, como aliadas na luta indígena.

Unindo cinco etnias e jovens de sete estados, o Coletivo Tibira surgiu para afirmar a existência de LGBTQIA+ indígenas nas aldeias e nas cidades. O objetivo é criar um espaço seguro de discussão e acolhimento, orientando jovens indígenas LGBTQIA+ e fortalecendo o movimento.

A discriminação pode acontecer dentro das próprias aldeias e, em muitos casos, falta representatividade. E quando vão para centros urbanos — cursar uma universidade, por exemplo — também são alvos de preconceito. Tanaíra Silva, uma das criadoras do coletivo, defende que “os indígenas que vivem no contexto urbano são atravessados por uma lógica não indígena, somos transpassados por racismo e desqualificação, isso gera uma enorme dificuldade de se inserir”. 

Pandemia

De acordo com um estudo feito pelo coletivo VoteLGBT e pela Box1824, um escritório de cultura e inovação, sobre os impactos da pandemia na população LGBT+ brasileira, a população indígena está entre os grupos mais vulneráveis em relação à COVID-19. O estudo contou com a participação de 9 mil pessoas de todo Brasil e analisou os impactos na saúde emocional e na falta de fonte de renda, por exemplo.

Outro dado preocupante apontado pela pesquisa é que a taxa de desemprego entre pessoas LGBTQIA+ foi quase o dobro da média nacional registrada pelo IBGE, no primeiro trimestre deste ano. Cerca de 24% das pessoas entrevistadas perderam o emprego durante a pandemia.

O diagnóstico indica algumas possíveis ações para transformar essa realidade. Entre as estratégias, estão o fortalecimento das redes de apoio e a priorização de profissionais LGBT+ para trabalhos e oportunidades. Você também pode conhecer e ajudar alguns projetos aqui.

Indígenas LGBTQIA+ para conhecer

A imagem estereotipada de pessoas indígenas vêm se contrapondo às muitas personalidades indígenas atuais que usam sua voz para trazer mais visibilidade às suas lutas. Seja na arte, na música, na educação, na criação de conteúdo, podemos encontrar pessoas que estão sendo resistência e ocupando lugares muito importantes. Agora, vamos conhecer indígenas LGBTQIA+ que estão se destacando no cenário nacional.

Indígena LGBTQIA+: Uýra, por Hick Duarte
Artista indígena, bióloga e educadora. Criada por Emerson Pontes, Uýra consegue unir as lutas LGBTQIA+ e indígena ao debate da conservação da natureza. Atualmente, participa de uma exposição no Museu de Arte do Rio (MAR) com a performance fotográfica intitulada “A Última Floresta”, onde denuncia o desmatamento e o desaparecimento de espécies botânicas. Emerson defende “sou indígena mesmo habitando a cidade e a contemporaneidade”.

Foto: Hick Duarte

Indígena LGBTQIA+: Yacunã e seu desenho ao fundo
Yacunã é artista visual e uma das principais lideranças em defesa da causa indígena LGBTQIA+. A ativista, da etnia Tuxá, tem um extenso portfólio: foi uma das artistas da exposição “Véxoa: nós sabemos”, na Pinacoteca; também participou da exposição coletiva e virtual “Amar, verbo transitivo” e da exposição virtual “Um outro céu”. Através de ilustrações, colagens e desenhos, Yacunã começou a divulgar seu trabalho em suas redes sociais em 2019, falando sobre espiritualidade, memória e sabedoria das anciãs de seu povo.

Foto: Divulgação/Instagram @yacunatuxa

Indígena LGBTQIA+: Victor Reiz com folhas ao fundo
Victor Reiz, ou INDIO, é diretor criativo, fotógrafo e designer. Já trabalhou em diversas produções de projetos audiovisuais e com nomes importantes para a comunidade LGBTQIA+, como a drag Gloria Groove (A Caminhada e Bonekinha), Iza (Gueto e Let Me Be The One) e Gaby Amarantos (Vênus em Escorpião). Victor também é um dos responsáveis pelo Coletivo Tibira.

Foto: Divulgação/Instagram @victorreiz

Indígena LGBTQIA+: Laís Eduarda Tupinambá por Rayhata
Laís Eduarda Tupinambá é ativista dos direitos das mulheres indígenas e estudante de Humanidades na UFSB. Do povo Tupinambá de Olivença, Laís atua na gestão da Rede pelas Mulheres Indígenas, projeto que busca melhorar a realidade de mulheres indígenas do Nordeste, e é colaboradora no Projeto Papo de Índio, canal que discute gênero, diversidade e sexualidade indígena.

Foto: Rayhata

Indígena LGBTQIA+: Katú Mirim por Rodolfo Magalhães
Katú é atriz, rapper e fundadora do portal Visibilidade Indígena. Através das redes sociais, Katú Mirim conta sua jornada em busca de si mesma e suas raízes. Filha de aldeia e quilombo, resistência indígena na periferia, suas músicas falam de sua vida, da retomada de identidade, memória, racismo, gênero, espiritualidade e do todo que a faz ser quem é. Em 2021, criou a tag #Indigenasjobs com o intuito de promover uma ponte entre indígenas e o mercado de trabalho.

Foto: Rodolfo Magalhães

Estas pessoas são apenas alguns exemplos de indígenas LGBTQIA+ que estão ocupando diversos espaços e levando ambas as pautas para sociedade através de seus trabalhos. São pessoas que lutam diariamente contra o preconceito e que ajudam a construir uma sociedade mais diversa e inclusiva. A população indígena faz parte da história do Brasil e hoje você descobriu que faz parte da história do movimento LGBTQIA+ também.  


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